O capataz é aquele que gere a riqueza que não é sua, domina
o que não é seu, faz o que o chefe mandar, age pelo que o mandante não age; são
suas as mãos sujas que ferem, que roubam, que violentam, que caneteiam, engavetam, em segundo, terceiro, quarto e último escalão. Em troca de
míseros trocados de um cargo, de um pixuleco qualquer, cujo rendimento vai
alça-lo às filas dos “outbacks”, dos “hondas” e das “rovers”; aos resort luxuosos,
ao vinho mais caro, ao whisky mais antigo; as grifes internacionais.
O capataz é o escalonado que faz e desfaz, em nome do
dono; sim, ele tem dono; é fiel em sua empreitada; é empreiteiro de mandados,
aceita qualquer negócio, se vende e se prostitui por qualquer trocado; quer
apenas se dar bem. Por ser indigno, envilecido, não precisará apresentar
currículo para o exercício de sua função, aliás, prescindirá de qualquer
formação acadêmica, precisará apenas de sua argúcia, esperteza e sagacidade
para escamotear, sabotar com toda sua vil competência, sem qualquer tipo de
escrúpulo. Esse exemplar proliferado em todos os lugares: repartições,
empresas, igrejas têm tido lugar garantido na esteira de um mercado cuja
ganância, competitividade, distinção predominam. Esquece o capataz, que tudo
isso, também, o introduz nas entranhas do inferno, o conduz irremissivelmente,
às dores cruciais do remorso e do ranger de dentes, ainda, mesmo, aqui, nesse
espaço-tempo do agora, nessa vida, até antes dos sete palmos e do caixão de
luxo.
A indignidade, a falta de decência, a prática dos mais
baixos costumes envilecem o ser humano. Contra essa chaga não há remédio, não
há purgativo, não há oração! O acometido nem se enxerga como tal; não se
reconhece como pária da sociedade e, muito menos, procura a cura de sua doença
moral. No entanto, ser indigno tornou-se item curricular, ainda, imprescindível,
no mundo de hoje (já em ruínas). Ainda se imagina ser preciso ter ao lado,
mexendo na podridão, indivíduos que não se importam em chafurdar na incúria do
mal feito, infringir leis e fazer o diabo, em nome e no lugar de quem detêm o
mando, a propriedade, a riqueza e o poder. Essa é a triste função da capatazia;
intermediação entre o opressor e o oprimido; também, conhecida como assessoria,
cargo de confiança, gerência, gestão, ficha suja.
Os capatazes vicejam, perduram e perpassam por governos e
partidos; são úteis. Agem como coveiros, cuidadores de porcos - longe dos
ambientes de trabalho honesto desses profissionais - porque precisam mexer na
lama, cavar o chão, enterrar quem possam, em nome do pseudo poder de um cargo,
em nome de um chefe, objetivando simplesmente a sua sobrevivência, e, até,
prosperidade, dependentes de generosas sobras das mesas dos seus donos. São capatazes, intermediários, nada mais,
dependem de si mesmos, de suas vontades de serem o que são.
Mas, a vida segue, o
tempo corre e esses vis serviçais, sem mesmo se aperceberem, já fenecem, em
vida - de dentro de suas câmaras mortuárias ambulantes, do conforto de seus
home theater, nas cadeiras estofada de seus gabinetes - dominados ainda pela
crença de que dominam, mandam e reinam.
Salvem todos aqueles que, tendo passado pela dura prova
do convite, negaram-se a esse ofício imundo, preferindo trilhar o caminho da
digna, honrada e dura vida dos milhões de comuns mortais, que acordam, lutam e adormecem
sem terem prejudicado a uma única alma, sem terem-se apropriado de um único bem que
não lhes pertença. Salvem os honrados, os que já conseguem enxergar que estamos
vivendo um novo momento histórico-energético no planeta Terra. Nesse tempo, eles,
os capatazes, já começam a ser reconhecidos e identificados. Distinguir-se-ão,
não pelas roupas de grife que enfeitam seus cadáveres ambulantes, mas pelo rastro
que deixam em seus fracassados caminhos. Haverá o dia em que o poder e
a riqueza prescindirão de suas “competências”. Esse momento está chegando, já
se pode vislumbrar logo ali, no horizonte que já vem.
Maria Angela Coelho
Mirault – Professora, Doutora e Mestre em Comunicação e Semiótica pela PUC de
São Paulo.
http://mamirault.blogspot.com.br
Nenhum comentário:
Postar um comentário