A proposta de uma
pedagogia filosoficamente pautada na “varinha-bíblica” não educa ninguém. Há uma
irreconciliável incompatibilidade entre dois tipos de deuses no imaginário
religioso-cultural. São antagônicas as propostas de um deus justo com a ideia de
um deus impiedoso, perseguidor e implacável, ao qual se deve o temor; quem a um
teme, ao outro não crê. O vingativo é o deus do escambo: é aquele que dá ‘se’,
antes, receber (moedas, oferendas, orações); para depois (sem garantias) atender,
no tempo dele. O misericordioso ama infinita e incondicionalmente todas as
existências, suas possibilidades intrínsecas e imortais, dá sem receber, imune
à vindita e ao comércio; espera por “todas as suas ovelhas”, muito além e aquém
das leis do tempo convencionado. Ao primeiro - equivocado, omisso, e perdulário
- atribuem-se as calamidades, a sorte, ou azar; mantém tudo e a todos submissos
aos seus caprichos, infringindo as dores do “ranger de dentes” e a promessa
cruel do inferno. É um péssimo pedagogo; arbitrário controlador de
almas-infantis; sua produtividade e competência, zero.
A formulação
religiosa-cultural, oponente a ideia de que estamos perdidos do lado de cá e de
lá, anuncia alvissareira possibilidade, prometendo-nos a perspectiva de um deus
a nos oferecer as bem-aventuranças: justiça e amor; perdão, reconciliação e
verdadeira plenitude no vir a ser (bom e justo). Este pedagogo nos apresenta como tese
conclusiva que, além da lição redentora, espera, sabiamente, o desabrochar de
toda sua criação; não apenas da sua “panelinha” de adoradores escolhidos e
convertidos, aleatoriamente provenientes da cega submissão. Se já não se pode
crer, pedagogicamente, no primeiro, no segundo, pode-se encontrar conforto em
seu projeto educativo e claras metas, objetivos e finalidade (“Eu sou a Luz, a
Verdade e a Vida; ninguém vai ao pai se não por Mim”), ainda que “andemos no
vale das sombras”, perambulando pelas calçadas da vida. Não desiste de nossas
imperfeições; nada quer em troca, senão a resistência, a resiliência; a busca;
a perseverança do acerto. Não utiliza a
“vara” como correção de nossa alma – por circunstâncias próprias - infantil e
rebelde. Grande Pedagogo!
A tortura sob o
preceito da “vara-bíblica”, justificada em Provérbios (Velho Testamento), como
ferramenta pedagógica é, ainda, ensinada e aceita, equivocada e anacronicamente,
não por ateus; ou agnósticos, mas, por gente que professa o cristianismo-punitivo.
Ainda hoje, a Pedagogia da “vara-bíblica” se impõe nas mais variadas incursões
da vida; transborda dos púlpitos e templos, das mais diversas crenças, chega às
casas, às ruas e às escolas. Porém, após a mensagem pacificadora e amorosa da formulação
cristã, há uma opção pedagógica de caminhar e de vencer as agruras da vida.
Substituir a (auto) punição, a (auto) perseguição, a (auto) condenação pelo
imperativo do amor categórico e supremo, de um deus, cujo paradigma – ainda em
confronto - intentou a tudo revolucionar, é uma necessidade a ser trilhada com
destemor, por cada um, individualmente. Esse Deus “compassivo e misericordioso,
paciente e cheio de amor e de fidelidade” (Êxodo 34.6) é o modelo, a opção de
escolha, ao qual, o “pedagogo infalível” ainda busca se fazer compreender. Para correção de nossas faltas, não é ético
nem lícito, nem caridoso, usar da “varinha-bíblica”, em nossas canelas, ou,
nossas almas. Deixando-se ferir sem ferir, sem afrontar, exemplificando,
pedagogicamente, sua extrema compaixão e paciência para com os “que não sabem o
que fazem”, expirou aqui para provar que tudo o que realmente nos espera e nos
interessa em plenitude está do lado de lá. Seu paradigma-pedagógico-educativo
foi a de propor a crença no reencontro de todas as “ovelhas perdidas”,
reconciliadas. Em paz.
Repudiemos, pois, desvalidas
crianças, em processo educativo, a antipedagógica lição da
"varinha-bíblica, que o anacrônico deus-de-pilatos insiste em nos
infringir. Prevaleçamos!
Não é só o Natal de
2017; as Eleições de 2018; mas, é o 4º. Milênio que está logo ali. Caminhemos,
confiantes; não estamos sós.
Maria Angela Coelho Mirault – professora, Dra. em Comunição
e Semiótica pela PUC de São Paulo
Nenhum comentário:
Postar um comentário