terça-feira, 19 de outubro de 2010

AOS INDECISOS A DIFÍCIL OPÇÃO

Será que como eu alguém tem se perguntado como nos levaram a essa encruzilhada política; nesse arrastão de consciências a que estamos submetidos nesse segundo turno das eleições presidenciais? Como decidir entre o ruim e o pior ainda? Que poder é esse que urdiu e ungiu essas candidaturas que, agora, nos obriga a escolher entre o roto e o esfarrapado?
Durante dias, tenho tentado capturar em ambos os candidatos indício capaz de inspirar alguma confiança e que possa justificar minha ida compulsória até a cabine de votação, no próximo dia 31. Suas mídias primárias, contudo, indiciam segundas intenções em suas vacilantes, vãs e inúteis promessas (salários, mutirão, Pac’s, Upa’s, etc). Lembro-me do embate intrapartidário, travado pelo candidato com relação a sua candidatura, assim como a escolha do seu vice, ambas conseguidas à custa, sem dúvida, de sua “determinação”. Do mesmo modo, recordo-me do projeto “20 anos de poder” do Zé Dirceu e dos acordos políticos culminando na escolha do PT por uma eminência parda do PMDB a vice-presidência.
A avaliação que venho fazendo sobre o descompasso retórico do candidato, fez com que me recordasse de uma das mais nefastas privatizações do seu partido no governo FHC: o projeto mercantilista do ensino que promoveu arbitraria e sub-repticiamente a privatização do ensino superior, em nosso país. Para mim, esse é um dos maiores males perpetrado por um governo em nossa história contemporânea. O sucateamento do ensino público fez emergir um conglomerado de “botecos”, franqueando a um mesmo grupo a propriedade privada de 22 instituições universitárias desse tipo. A criação das IES, os Institutos de Ensino Superior, que cogumelam em todo o território nacional, enriqueceram grupos empresariais da noite para o dia, enquanto as universidades federais, debilitadas e comatizadas, esfacelaram-se, vilipendiando o ensino e a própria profissão de professor.
Ao submeter o ensino às regras do mercado, estimulou-se a mediocrização do país. Com exceções de poucas, tradicionais e sérias instituições privadas de ensino, essas empresas não oferecem – e nem permitem - espaço para a dialética. Deste lugar, em que, historicamente, abrigavam-se a controvérsia e o confronto de idéias, não mais se pode esperar que emirjam lideranças políticas e sociais capazes de conduzir de verdade esse país ao seu tão sonhado destino. Por isso estamos falidos e nem sei quando desse mal conseguiremos nos refazer. Não, decididamente, não posso deixar de considerar esse feito funesto, na hora da minha opção.
Por considerar ser a Educação a única saída para os milhões de soterrados que somamos, creio que, enquanto não nos dermos conta dessa verdade, que se evidencia tão agudamente nessas eleições, seremos todos meros tiriricas votando em tiriricas. Reconheçamos, as fachadas não importam, nós, o povo brasileiro, elegemos, nessas eleições de 3 de outubro, mil arremedos de tiriricas, apelidados e escamoteados por outros nomes e currículos por todos os quadrantes nacionais, como resultado da catástrofe nacional no quesito educação-ensino- instrução.
Mas, ao descartar O candidato, como optar por sua oponente quando a reconheço como representante da maior esquizofrenia ideológica vivenciada por um partido, que assumiu o poder pela oposição que fazia como contra-ponto ao status-quo neoliberal, vigente? Mancomunada com os sarneys, renans e collors da vida e tricotando as mais estranhas coligações, ela é a metáfora maior da colonização que vimos sofrendo ao longo desses anos e que sublinharam cada dia dos oito anos do governo participativo da era lula. Seu sorriso histriônico em uma face esculpida por marketeiros, cabeleireiros e visagistas não é capaz de inspirar a confiança de quem tenha um pouco mais do que dois neurônios na cabeça. Sua simpatia estereotipada e extemporânea não a identifica com o feminino que habita em mim. Sua mídia corporal fala mais do que todas as suas palavras. Portanto, essa também não pode ser minha opção.
Não se pode escolher em sã e limpa consciência, nesse arrastão eleitoral a que fomos encurralados. Se, de um lado, apresenta-se o retrocesso político e a arrogância de quem insiste em declarar sua qualidade por ter “idéias próprias”, do outro, o que temos é uma candidata colonizada que não pode manifestar francamente as suas, enquanto nós - meros cidadãos brasileiros – somos obrigados a cumprir um dever nacional e ter que decidir entre o ruim e o pior ainda; entre o roto e o esfarrapado. Escolhendo o primeiro, pelo menos, ajudo a promover o desaparelhamento do Estado que o governo-lula tão ardilosamente cometeu. Escolhendo a candidata, dou um crédito as suas promessas no quesito educação. E aí?
Pois, que ambos se explodam; o voto da classe média e esclarecida não vai decidir as eleições. Que se explodam todos os que querem me convencer a essa difícil, se não, impossível, escolha. Que ganhe qualquer um, já que quem governará serão os mesmos velhos colonizadores de sempre; eles, os que impõem os conchavos, a cumplicidade, os acordos políticos. De qualquer modo, eles estarão eleitos e representados na Presidência da República do nosso País.
Pois, bem, recomecemos tudo de novo, dia 1o. ; pois teremos mais quatro anos pela frente. Se não foi ainda para a minha geração, nem para a geração dos meus filhos e talvez, ainda, não o seja para a dos meus netos – somente a EDUCAÇÃO DE QUALIDADE será nossa cápsula de resgate; nossa fênix de saída; a única apropriada a solucionar os problemas decorrentes do soterramento intelectual e moral, que nos mantém tão medíocres e acuados frente às escolhas que fizemos em má ou sã consciência. Como o acaso não existe, Oxalá minhas preocupações se diluam na esperança que todos os brasileiros demonstram e depositam nas urnas, e que vença o roto ou a esfarrapada, quem sabe, o menos pior.



MARIA ANGELA COELHO MIRAULT
Doutora e Mestre em Comunicação e Semiótica pela PUC/SP
Mariaangela.mirault@gmail.com


O artigo foi publicado no jornal Correio do Estado, em Campo Grande, MS, 19.10.2010.

terça-feira, 5 de outubro de 2010

IDENTIDADE TIRIRICA

Não, num foram votus de protexto qui elejeram tiririca. Não, se o foçe, seriam votus intenssionais com o intuito de produsir menssageim qui os traduzicem e espreçacem conxciênssia política. Os mais de um milhão-e-trezentus mil votus ssão mais do que issu. O eleitor do “deputado-tiririca” depozitou nas urnas ssua indentidade nassional.
Estamus diante da máquina e da sagassidade dos marqueteiros pulíticus. Tirica não é um cidadãum político, filhiado a um partido porlítico. Foi produsido pra faser ezatamenti o que feix: levar cum sua exmagadora votassão mais quatros eleitus cum seus votus. Não, ele num vai ssozinho, vai comduzindo um bonde juntu cum ele, eces sim, conxcientemente, políticus; se é que política é isso o que extamos acompanhandu cum us rezultado das eleissão.
Comtudo, o deputadu mais votadu du Brazil, está em vias de ter sua eleissão invalidada, acuzado qui está pelo Ministério Público paulista de ter prextado falssidade ideológica, ao fraldar ssua decrarassão ao se inscrever-sse comu candidato. Um estudo de grafologia dá indíssius de que num foi da sua lavra a aprezentação da declarassão qui feiz ao Tribunal Eleitoral. Agora, ele tem deiz dias pra defendersse. Pois, bem, o que temus nesse episódio do abextadu eleitu deputadu federau? Se invalidada sua espressiva votassão, pra onde irão os milhão de votus que arregimentou? E us “eleitus” do sseu bonde, como ficam? E a vontadi du povu qui o elegeu? Desrrespeitada, é? Nananinanão!
Pur que é qui Tiririca num pode ser invextido nu cargo qui milhões de eleitores dessidiram na urna, se ele é a cara do Brazil?
Vou defender tiririca. Si provadu seu analfabetismo, o qui é qui teim; somos milhões de analfabetus mexmu, em todus os níveis de excolaridade; analfabetus em primeiru, sigundu e tersseiru graus.
Vou defender tiririca. É palhassu, mais e us tantus qui vaum competir com ele nu Congresso, de terno, gravata e barba feita em seus disfarsses no plenáriu?
Vou defender tiririca. É sinçeru, pois, declarou, já em campanha, qui num sabe o que vai fazer lá, mais quandu souber, o abextado nus dirá. Viva o deputado federau tirica, pois nenhum dus que ajudei a eleger, me diçeram - e eu continuo cem saber - o que fizeram e o que fazem lá.
Vou defender tiririca. Apresentou declarassão falssa, configurada em falcidade ideológica? E daí, se os ficha-limpa em quem votamos, quando pegos, dexmentem o comprovado, o óbviu e se elegem e se reelegem rindu da cara da genti, com fogos, artifíssius e “ceriedade” cum noço dinhero.
Vou defender tiririca. Ele é a cara da gente, de quem votou e de queim num votô em ssua desfaçateiz.
Não, não tem mesmo jeito, o mesmo povo que vende seu voto é o mesmo povo que vota gratuitamente em tiririca; fazemos parte da mesma moeda e temos essas duas caras. Ambas, provêm do mesmo caldeirão efervescente da ignorância de grande parcela de “abestados” que formam a esmagadora maioria da sociedade brasileira, apartada que se mantém da escola, do ensino e da educação decentes e de qualidade.
O que se depreende, nesse episódio, e se não invalidarem sua expressividade eleitoral, tiririca vai fazer no Congresso o que sempre soube fazer – palhaçada. E pelo que vemos, estará sim, no lugar certo para se praticar a pantomima, pois lá, com ele coabitarão inúmeros colegas de profissão.
Mega-sena acumulada, vontade de enricar... Tiririca no Congresso tomando posse como a maior expressividade eleitoral do Brasil... Senhores feudais reeleitos, voto-a-voto, comprado ou não, em todo o Brasil...
Ainda bem que nos restou um segundo turno pra decisão do jogo. Tomara que não se brinque tanto com esse pleito. De qualquer forma, algumas coisas precisam ser feitas. Primeiro: precisamos reconhecer e assumir nossa identidade-tiririca, para somente depois, e com urgência – e muito trabalho - nos afastarmos dela. Precisamos combater nosso analfabetismo; precisamos urgentemente deixar de fazer palhaçada em hora de seriedade.
Tal como nos ensina o Pai-Nosso, precisamos não eleger ficha-suja na medida que nos tornarmos fichas-limpa. Mas, por agora – e mais alguns anos -, não tem jeito, temos é que, abestadamente, engolir nossa identidade nacional; usarmos nossa roupa de palhaços e nos deslocarmos no nosso cotidiano, palhaçadamente tiricas, em casa, no mercado, na escola, no trânsito, na assembléia, no congresso e no alvorada.


Maria Ângela Coelho Mirault
Doutora e Mestre em Comunicação e Semiótica-PUC/SP
mariaangela.mirault@gmail.com

Publicado no jornal Correio do Estado,Campo Grande, MS, 08/10/2010