quinta-feira, 10 de agosto de 2017

Guilhotina não


Embora haja, sim, anacrônicos-professores-doutrinadores, em todas as instâncias, com predominância para aqueles “pentecostais”sem noção, para os quais, Marx e Engels são a solução do mundo, não se pode, sequer, considerar a proposta indecente de uma “Escola sem Partido”.
Mas, eles estão fortalecidos, agendaram evento, na Câmara Municipal de Campo Grande, trouxeram a liderança dos bolsonaro-da-vida para a empreitada, com o aval da Diocese de Campo Grande (será?), que, permitiu se distribuíssem panfletos a saída de suas igrejas.
Estamos mesmo todos abobalhados com os acontecimentos atuais. São estarrecedores os fatos que nos chegam por intermédio da mídia. Orwellianizados, somos todos vistos e escaneados todo o tempo. Não há mais privacidade; tudo está irremediavelmente desvelado. Estamos nus e não há a quem recorrer. Parece que vivemos um momento em que todas as instituições estão carcomidas pela ferrugem e contaminadas pelos fungos da corrupção, da falta de moral e do predomínio dos maus costumes.
Supor que a fixação de cartazes nas escolas de Campo Grande inibirá os doutrinadores de suas pregações é um pensamento canhestro, inconcebível e ignóbil. Eles foram treinados; saberão como se rebelarem, continuando suas pregações. Em contrapartida, uma nobre profissão e a maioria de seus profissionais estarão avassalados, em guetos de espúrias delações.
Será que toda essa desordem que toma conta do país, em todos os poderes, todas as esferas, em cada repartição de governo está nos desorientando; conduzindo-nos, agora, a imposição e a aceitação dos recursos da mordaça? A guilhotina do direito sobre nossa liberdade de expressão, limpidamente expressa na Constituição?
Será que a crise de autoridade, de ordem, de credibilidade e de respeito, que nos nocauteia todos os dias, está nos ensandecendo, empurrando-nos cada vez mais para o muro da insensatez?
Será que o controle, a denúncia de uns contra os outros nos trará uma escola limpa, anódina, mais “desemburrecente” do que a que produz milhares de analfabetos funcionais?
Somos, ainda, e, graças a Deus, um país livre. É livre a manifestação do pensamento. É um direito inalienável, emitir, livremente, opiniões, ideais, sem medo de retaliação ou censura, seja de quem for. Essa liberdade é conceito fundamental do estado de direito nas democracias. Qualquer inibição desse preceito é censura e é imoral.
Direito humano protegido pela Declaração Universal dos Direitos Humanos - e, pelas constituições de vários países democráticos - desde 1948, prediz que “Todo ser humano tem direito à liberdade de opinião e expressão; este direito inclui a liberdade de, sem interferência, ter opiniões e de procurar, receber e transmitir informações e ideias por quaisquer meios e independentemente de fronteiras" (artigo XIX).
Estabelecer rédeas seja a quem quer que seja é crime constitucional. Como é possível que uma Casa de Leis; Igrejas e alguns idiotizados defendam essa ideia, e, proponha um Seminário, em nossa cidade, para que uma discussão direcionada legitime mais uma, dentre tantas, aberração inconstitucional? Essa tentativa já se frustrou há pouco tempo. Seus autores arredaram, e, agora, voltam fortalecidos pelo esculacho geral que toma conta do país, sob a liderança do filhote bolsonariano, trabalham por uma guinada de 180 graus em nossos costumes.
Não é porque o PT avacalhou com a democracia, usurpou a Nação, conciliou-se com a política no seu sentido mais abjeto, abrigou o pior disponível e cúmplice aos seus projetos, que nossa saída será o retrocesso. Não é. Não serão eles quem nos trarão a ordem, a esperança e a bonança.
É na liberdade de consciência que se encontra nossa maior riqueza de transformação de um mundo que volta a Idade Média e quer vingança, antes da justiça; controle, antes da ação.
Como professora há décadas, livre pensadora, cidadã do mundo, cumpridora de minhas obrigações só posso lançar o meu libelo. Não a guilhotina do pensamento! Não a mordaça em minha boca! Vocês não podem induzir parte da sociedade com esse imbróglio. É justamente o contrário, quando estamos e somos livres é que conseguimos buscar soluções para nossas divergências. Sempre haverá.


Maria Angela Coelho Mirault – professora doutora em Comunicação e Semiótica pela PUC de São Paulo
10/08/2017

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