domingo, 1 de março de 2020

Quem você leva na mochila



Março! Finalmente, 2020 acabou de começar. Finda folia – necessária porque ninguém é de ferro – o ano chega com tudo. Os astrólogos designam a data de 22 de março, início do domínio de Aries como data astrológica de início de um novo ciclo. E este novo ciclo vem com Júpiter, Mercúrio, Plutão, Saturno, suas conjunções e suas complicações, arrumando a casa. Ano da Justiça e da Verdade, afirmam; mudanças profundas, também; reinícios... Para nós, os mesmos mortais de sempre, mais um ano, ou, menos um, em nossa conta de tempo; cada dia mais próximos, da partida inevitável. Enfim...
Agora, começam de fato as aulas. A Cidade canta com eles; nossas crianças e jovens de volta à escola. Mas, o que carregam eles em suas mochilas?
É fato que somo personas plurais, em amplo sentido; conosco mesmo e com os que orbitam em nossa vida. Há muito tempo escrevi um poema que dizia assim: “Eu não sou só eu; você não é só você... somos plurais”. “De onde viemos, para onde iremos; quem arrastaremos”. A vida trouxe as confirmações da constatação literária. Ninguém passa sem arrastar suas correntes, nem sem se tornar elos das demais. Sem mais divagações; a questão é: quem se carrega nas mochilas?
Nas mochilas de nossas crianças e jovens; nas bolsas e pastas dos professores, encontram-se toda uma linhagem familiar; pai e mãe - todos os antepassados -, destinos, cultura, crenças, dogmas, “verdades”, mundo interior, feridas e cicatrizes.
Bert Helliger reuniu todo seu conhecimento, todo seu referencial pedagógico, toda sua sabedoria e interpretação das Leis irrevogáveis que regem a Vida. À partir de suas observações de comportamento de tribos africanas; onde passou parte de sua vida de padre católico, trazendo à luz os conhecimentos que adquiriu como pesquisador do comportamento humano, deu significado ao que conhecemos hoje por Constelações Familiares. Corroborou sua tese em um dos mais renomados biólogos da atualidade, Ruper Sheldrake, que concebera, em 1981, o que veio chamar por campos mórficos – um lugar particularíssimo de registros de informações que nos pertencem e no qual habitamos, indubitavelmente. Não somos indivíduos sem registros, sem origem, sem histórias. Nesse campo, somo plurais. Ao participar de uma Constelação, essa evidência se mostra: experiências vividas por nossos ancestrais, que nem tínhamos conhecimento revelam-se surpreendentemente. Podemos, então, constatá-las, reverenciá-las, honrá-las e, apaziguados, seguir adiante e escolher a vida, a luz que nos adianta os passos. Desse modo, é cada dia mais pungente que nos reconciliemos com o passado para desfrutarmos o presente e seguir para o futuro. Todos fazem parte. Todos que nos antecederam e permeiam nosso ambiente sistêmico e morfogenético. Tudo é informação. Tudo se comunica e transcende.
É de bom alvitre pensar na possibilidade de que nessa pluralidade, não estamos sós. Somos muitos; somos plurais. A ancestralidade que nos trouxe á vida está em nosso presente; é preciso que nos reconciliemos com ela. Principalmente, aqueles, dentre nós, que foram excluídos, aqueles de quem ninguém fala e que se procura esquecer. Dar-lhes lugar no sistema – campo morfogenético -, reverenciar-lhes a passagem pela vida, honrá-los, é de fundamental importância.
Que os professores tenham a noção de que em suas salas de aula, adentram também essas memórias informacionais. Nas mochilas e vidas dos seus alunos, adentram, também, seus pais e todos os que vieram antes e lhes trouxeram a vida, bem como, nós, professores, também, carregamos em nós essa complexidade. Deve ser por isso, que, nessa missão, como condutores de vidas com o intuito de viver o aqui e agora a caminho do amanhã, seja tão importante; razão pela qual, deve (deveria) ser tão reverenciada. São muitos os nossos pupilos ocultos aos nossos olhos, carregados nas mochilas. Honremos.

Maria Angela Coelho
Professora Doutora em Comunicação e Semiótica pela PUC/SP
Terapeuta em Práticas Integrativas e Complementares à Saúde

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