sexta-feira, 8 de outubro de 2021

QUEM VEM ANTES PREVALECE NA FILA DO PÃO

 Em tudo se pode ter como conselheira idônea, apenas uma Lei: A Lei da Ordem. Está tudo certo, já reverenciava o velho samba “Tudo está em seu lugar... graças a Deus, graças a Deus!” Verdade pura, não aprendida, óbvia: o mau governo – o bom governo; o bom político – o mau político; o corrupto e o corruptor, o explorado e o explorador estão cumprindo uma Única Lei, a Lei da Ordem, que se imporá, depois da Desordem, essa, sim, momentânea; porque não é lei. Feio, né? É. Mas, verdadeiro. A Teoria do Caos demonstra e explica direitinho “esse absurdo”: tudo que aparentemente está em desordem é apenas um estágio anterior à Ordem. Outorgas foram demandadas e atendidas; demandas estão sendo cumpridas; não caíram do céu – ou, caíram, sim, do céu. Tudo está certo. Plantio e colheita, também, refletem essa Lei: “ajoelhou? Vai ter que rezar”! “Pau que dá em Chico, dá em Francisco”! E, porque a Ordem é magnânima e um categórico universal; nada a poderá derruir. Estudar astrofísica, astronomia, cosmografia ajuda? Ajuda.

 Derivadas dessa lógica, mais três Leis emergem e regem a vida. A Lei da Hierarquia é a primeira: tudo o que veio antes, em primeiro está. E, nisso reside o seu lugar. Quem chegou antes, pertence antes: primeiro filho; primeiro marido; primeiro namorado; primeiro tudo. Aos primeiros “toda honra e toda a glória”, as quais os segundos, terceiros e milésimos necessitam reconhecer e acatar. É imperativo. Filas são metáforas dessa Lei e de fácil entendimento. Da Lei da Hierarquia deriva (ou parelha) a Lei do Pertencimento. Quem chegou antes tem o seu lugar indelegável. É seu o direito de ali estar e pertencer; é ímpar esse seu lugar. O segundo filho não pode ocupar o lugar do primeiro; o quarto marido têm de reconhecer o lugar dos três que o precederam, para poder pertencer ao seu, circunstancial e momentâneo, na fila do pão.

Bert Hellinger – o decodificador e sintetizador dessas leis - fala muito seriamentes sobre isso: todos com quem tivemos um relacionamento afetivo-íntimo, por exemplo, fazem parte e estão realmente na fila dos ocupantes do seu lugar naquela fila; tira-se da vida, do pensamento, mas, eles continuam lá. Ele diz isso, e, as moças ficantes se apavoram. Mas, é da Lei: todos fazem parte. E, aí, como fica? Fica como está, dentro da Lei maior, da Ordem; cada qual no seu lugar. O passado não é tão longe assim. E, aí, o que é que eu faço pra me livrar “daquela praga”? Olhando a “praga”, reconhecendo sua presença, respeitando o seu lugar e despedindo-se, sinceramente: “Eu respeito a história que tivemos; respeito o seu destino; fico - agora que o reconheço - com o que me pertence e deixo com você o que lhe pertence. Agora, posso seguir para a vida”. Ponto! Com sinceridade, claro, cortando laços, reconhecendo aquele lugar de passível sucessão, mas,  inocupável.  Se eu os vejo, os reconheço e os respeito, posso dar o lugar devido ao “próximo”!  seja esse o terceiro, o décimo, ou centésimo lugar. O mesmo cuidado deve-se ter com a Família de Origem – é, aquela que nos trouxe a esse mundo. Ninguém precisa “amar”; “viver”; “coabitar” com a sogra (mãe do outro), ou com o sogro (pai do outro). Mas, todos têm como dever, vê-los, acolhê-los, reconhecê-los, respeitá-los, e, se, possível um upgrade, honra-los... Daí, tocar a vida. Eles, os medonhos, vieram antes. Seu marido/esposa já foi o bebê de alguém; humanos ainda não nascem de chocadeira. Esses seres de origem só querem ser vistos, reconhecidos e ponto final. Filhos, genros e noras podem “olhar” para trás, com gratidão, e, seguir adiante, é Ordem da Vida, sem precisar exilar e excluir ninguém. O reconhecimento, em verdade é um derivativo dessas leis trazidas até aqui: Ver, Reconhecer, Respeitar, Honrar e Agradecer não são apenas verbos, são sinalizações para se seguir sem remorso, culpa, ingratidão e cumprir a Lei Primeira.

Se eu ocupo o “meu” lugar na fila; eu pertenço a esse lugar que é apenas meu. Se cada um souber o seu lugar na Lei da Ordem (hierarquia e pertencimento) encontrará o seu lugar na Vida. Pronto? Não! Para que a Ordem impere, porém, necessário reconhecer a terceira Lei – derivada da Lei Maior da Ordem - a Lei do Equilíbrio: o Bom Dar e o Bom Receber. Se eu recebo, eu retribuo com igualdade; com isso, eu cumpro a lei. Ninguém deve dar de mais nem receber de menos! Em tudo, principalmente, no quesito relacionamento: afeto, amor. Quem dá de mais, ou de menos, fere a Lei do Equilíbrio que traz implícita a inequívoca Lei da Igualdade. Ninguém é mais do que ninguém. Se eu dou de mais, eu me coloco acima de quem recebe. Eu me arrogo à prerrogativa de ser o que “pôde” dar. E, podendo dar, eu insiro uma mensagem oculta de que o outro recebe porque é menor. Daí as trocas igualitárias do escambo: eu dou, eu recebo; você me dá em troca, em qualidade, o mesmo que lhe dei. Retribuição é sagrada; porque é Lei. Seja ela em dinheiro, tempo, trabalho, amor, gratidão, sorriso, oração. Disse um velho e sábio sacerdote: ninguém é tão pobre que não tenha o que dar, nem tão rico que não possa receber. Síntese essa dessa Lei do Equilíbrio. Essa Lei só não vale para filhos, que, só pelo fato de serem concebidos, conhecerem toda a abundância necessária para aportarem a esse mundo, jamais poderão cumpri-la no escambo com seus pais. Sem observarmos Ordem, Hierarquia, Pertencimento, Equilíbrio, continuaremos sem saber ocupar nosso lugar na fila do pão, seja “na rua, na casa, na fazenda”.

Nossa ignorância; inobservância nos mantém deslocados na vida. Não é a toa que estejamos tão alvoroçados no formigueiro: “Alguma coisa está fora de ordem”.

Maria Angela Coelho Mirault

Doutora em Semiótica pela PUC de São Paulo

Rio, 01 de outubro de 2021

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