terça-feira, 19 de agosto de 2014

NÃO AO FUNDAMENTALISMO RELIGIOSO EM CAMPO GRANDE

O fundamentalismo surgiu no protestantismo norte-americano em meados do século 19, cunhado por professores de teologia da Universidade de Princeton, expressos em doze livros - Fundametals. A Testeimony of teh Truth - e fazia a proposição de um cristianismo, excessivamente rigoroso, ortodoxo e dogmático, em contraste com o liberalismo norte-americano. Sob essa perspectiva, a Bíblia - por ser de inspiração divina - só deve ser encarada como o fundamento básico da fé cristã e tomada sob o estrito rigor da letra. Qualquer interpretação, ou contestação será obra de satanás. Essa concepção a respeito do texto sagrado coloca todo militante como um crente dessa “verdade inconteste”. Note-se, que se pode identificar o fundamentalista em toda e qualquer religião, e, mesmo, expansivamente, o convertido, em qualquer ideologia. Do mesmo modo, ressalve-se que, nem todo protestante é um fundamentalista. Afirma, Leonardo Bof, em sua obra “Fundamentalismo – a globalização e o futuro da humanidade” (Sextante), que o próprio Lutero já afirmava: “a Bíblia toda tem a Deus como autor, mas, suas sentenças devem ser julgadas a partir de Cristo.” Esclarece, ainda, Boff: “com o Concílio Vaticano II, a Bíblia é inspirada e inerrante (que não pode errar) só com referência às verdades importantes para nossa salvação”. Por isso, dizem, os católicos, “na Bíblia está contida a Palavra de Deus” e não “a Bíblia é a palavra de Deus”. Desse modo, qualquer pessoa que confere caráter absoluto ao seu ponto de vista é um fundamentalista, pois passa a acreditar-se senhor da verdade incontestável, daí sua intolerância aos pensamentos opostos. Na visão de Boff, “ ... a intolerância gera o desprezo aos outros, a agressividade, e agressividade, a guerra contra o erro a ser combatido e exterminado”. Dito isso, afirmamos que o Estado de Direito e Laico do Executivo Campo-Grandense foi pro ralo, exterminado, com a realização exclusivista, discricionarista, segregacionista e inconstitucional da malfadada Quinta Gospel, realizada no dia 14 do corrente, como um “presente para a cidade”. Muito longe de espalhar luzes, deu vazão à ação nefasta da treva. A lei no 5092, de 20 de julho de 2012, que “institui na praça do Rádio Clube a Quinta Gospel no Município de Campo Grande”, prevê sua realização “na quinta-feira que antecede a noite da seresta utilizando a mesma estrutura que é utilizada na noite da seresta”, e a “apresentação de artistas nacionais e regionais”, sob o patrocínio da Fundação de Cultura de Campo Grande, por si só, não exclui, a expressividade musical de outros segmentos religiosos, porém, seu teor deu margens à interpretação dúbia por parte da diretora-presidente (Sra. Juliana Zorzo) da FUNDAC e garantiu a exclusividade de apresentação de um único segmento religioso, em detrimento dos demais. Em maio deste ano, o ICE-MS (Instituto de Cultura Espírita de Mato Grosso do Sul), representado pelo seu presidente, João Batista Paiva, encaminhou ofício à Fundação solicitando participação de artistas espíritas no show. Em resposta (4 de agosto de 2014), a diretora manifestou-se com a argumentação de que “a indicação de artistas espíritas seria impossível” porque foge da proposta do evento destinado ao “público evangélico cristão”. O fato é que, apesar da ignorância do segmento religioso que “batalhou” a lei, não podemos admitir que houvesse qualquer mínima discrepância nas decisões de gestores com relação a dotações orçamentárias dos recursos públicos; o privilégio de uns e a exclusão de outros. Se o local é público, os recursos são provenientes dos cofres públicos, organizado e patrocinado por um órgão público – que se qualifica como uma Fundação de Cultura – e, sob o princípio que deve reger o Estado Laico expresso na Constituição Federal, que a Quinta Gospel garanta nas próximas edições a participação de todos os segmentos religiosos que nesse espaço queiram manifestar sua religiosidade por meio da linguagem musical. Caso o espírito fundamentalista - que vem pouco a pouco corroendo os espaços da gestão pública municipal - persista, que o Ministério Público faça valer a sua função de resguardar os direitos do cidadão (católico, espírita, ateu...), interfira pela revogação imediata dessa lei municipal; para que sirva de exemplo de forma que expedientes semelhantes não se perpetuem nessa gestão, impondo-se às leis que garantem, ao Estado laico brasileiro, o direito à livre expressão e manifestação religiosa em nosso país. Maria Angela Coelho Mirault – Professora Doutora em Comunicação e Semiótica pela PUC de São Paulo http://mamirault.blogspot.com.br

3 comentários:

Unknown disse...

Boa tarde, Maria Angela.

Meu nome é Álvaro.

Eu não sou um cidadão campograndense, leitor do Jornal que veiculou sua opinião referente a tal "Quinta Gospel".
Voce deixou o seu endereço eletrônico imagino que deseje receber os "feed-backs" dos leitores.
Por isso arrisquei escrever-te.

Serei breve, desejo apenas oferecer outros pontos de vista sobre o tema que voce abordou.
Concordo com a necessidade do estado ser "Laico".

Mesmo porque, não tem como instituir a consciência espiritual por decreto.
O caminho de Deus é outro, nasce de dentro para fora, e não imposto de fora para dentro sob penas da lei.

Infelizmente, ao que parece, sociedade humana e Deus são duas coisas incompatíveis.

Existem duas expressões nesse assunto que precisam ser compreendidas:
A primeira é "Estado Laico"
No dicionário, "Estado Laico" é definido assim:
"Que não tem religião definida, respeitando todas as manifestações dos credos religiosos e da fé."

Outra definição importante para o assunto é o significado do termo "Gospel".
Também do dicionário:
"Música de melodia leve e harmoniosa cantada em cultos ou shows evangélicos."
... ou ainda...
"Gospel é a forma contraída de “God Spell”, ou seja, palavras de Deus, que significa também botas notícias, boas novas, e etc. E "boas Novas" é do grego "evangelho" donde deriva o termo evangélico.

Ora, "Quinta Gospel" é um evento realizado por evangélicos e o estado por ser laico tem o DEVER de assegurar aos seus cidadão o direito de realizar seu culto de acordo com os fundamentos religiosos em que crê, sem que seus valores sejam afrontados por parte de pessoas adeptas de outras crenças.

Em qualquer nação verdadeiramente democrática é assegurado o direito à livre opinião, ao credo, a ideologia política, onde se respeita o direito que cada um tem de se expressar, de exercer sua arte, de "dar a sua contribuição" de forma ordeira, e não que todos falem ao mesmo tempo, sobrepondo-se uns aos outros, desrespeitando o direito do outro a sua manifestação.

Isso é sim o sistema da baderna, onde quem sai ganhando com a confusão é quem não tem nada a dizer.

Me pergunto:
Porque os interessados não reivindicam da PMCG a criação da "Sexta da tecnomacumba?",
... ou de qualquer outro segmento religioso?

Porque TEM que ser no mesmo dia e lugar?

Não haverá ai um certo capricho de "guerra religiosa" encabeçada justamente por quem se diz discriminado?

Será agora que todo evento com público alvo definido deve ser tratado como discriminação?

Quem busca um show Gospel, gosta é de Gospel, se gostasse de macumba ia num terreiro de macumba, tem tantos por ai, todo dia, não é mesmo?

Da mesma forma, se alguém gosta de macumba não devia ser forçado a ouvir música gospel...
...e não é... só vai na "Quinta Gospel" quem quer!

Mas afinal, que diferença faz, ser evangélico, espirita, umbandista, budista, etc? - Para entender a diferença se faz necessário estudar mais a fundo uma e outra.

Respeitosamente,

Luiz Carlos Nogueira disse...

Se cada religião for reivindicar seu espaço, ninguém mais vai conseguir assistir quaisquer outras apresentações que não seja religiosas. Parece até que cada religião tem um Deus diferente, né? E além de tudo esse tal de Álvaro é bem desrespeitoso e provavelmente é um fundamentalista fanático, para falar na criação da "Sexta da teconomacumba" (está sujeito a um processo judicial). Eu não sou ligado a quaisquer religiões por muitas razões. Ele fala em estudar a fundo as religiões, coisa que é visível que não faz, caso contrário não teria feito esse depreciação. Mando um recado para os que vivem com a bocas cheia de Deus e o coração cheio maledicências e de ódios: : http://umsul-mato-grossensenaweb.blogspot.com/2009/11/desde-quando-me-crucificaram.html

Unknown disse...

Luiz Carlos,
"Tecnomacumba" é o nome do grupo que reivindicava participar da "Quinta Gospel", este nome foi escolhido por seus integrantes e deve ser motivo de orgulho para eles.
Voce parece que ficou chocado!
Macumba é nome comum do sincretismo religioso no Brasil, sentir-se ultrajado pelo seu uso é que é preconceito!