A Semiótica – ciência que dá conta do estudo das
representações – nos leva a conceber a realidade não passível de apreensão
direta. Para tal, traz implícita a necessidade da intermediação sígnica que a
nomine e a signifique. Ou seja, cada ser percebe e concebe a realidade em
conformidade com um repertório personificado de significação. O azul do céu não
traz em si o seu significado; é objeto de interpretação e representação
semiótica. As coisas existem pelo significado que somos capazes de lhes
auferir. Nada é o que parece ser; tudo procede de significados que lhes damos.
É na condição de um ser simbólico, produtor e interpretador de signos e
significados, que o homem concebe e interage no mundo.
A Física Quântica – ciência que agudiza os conceitos
anteriores da Física Clássica – ao trazer a lume a perspectiva de que o fóton -
submetido em experimento a um observador - pode atuar, ora como partícula, ora
como onda, nos aponta para muitos mistérios a se revelar. Só o fato de que a
ação direta do observador seja capaz de modificar a realidade física, muda
tudo. Não existe o eu que olha e observa, mais; agora, existe o eu que modifica
e interfere no que vê. Assim, a realidade em si não existe, passa a existir sob
nossa intervenção e interpretação. Se há Sol lá fora e minhas cortinas estão
fechadas, minha realidade co-criada é escura, sombria; peculiar e minha. Desse
modo, cada um dos mais de 7 bilhões no planeta tem uma realidade de acordo com
sua capacidade de perceber, interpretar, decodificá-la e transformá-la,
absolutamente sujeita a sua presença no campo quântico, com o apetrecho de sua
cosmovisão, além, obviamente dos filtros provenientes da constituição física
que nos confere o arcabouço para estarmos no mundo.
A Cultura, por sua vez, é o habitat, no qual, inseridos,
somos instados a nos relacionar por intermédio de signos e significados
apreensíveis, compreensíveis e compartilháveis. É o ambiente ecologicamente
semiótico, preexistentes e subsistentes, a nossa curta vida, já pleno de
conceitos e de crenças enraizados, de valores, hábitos e comportamentos
configurados como verdades, que atravessam gerações. Nosso mergulho nesse vasto
caldeirão semiótico, de signos e significações constitui-se no filtro, na
lente, pelos quais tateamos na tentativa de compreender o mundo. Somos todos
ETs em espaços sistêmicos alosemióticos.
Bem, se a realidade é uma construção nominada, dependente
da semiose de significados peculiares, sob a regência de repertórios
pessoais... Se, ela pode ser concebida uma co-criação do observador, que ao
modificar o fenômeno que observa, passa a ser dela um participante... Se, a
Cultura é a lente que nos circunscreve em um ecossistema de significados não
compartilháveis... Se, ainda, a contagem do tempo é convencionada por
calendários não unificados, e, apenas parte dos bilhões do lado Ocidental
comemora com exaltação coletiva a convenção da passagem do ano, o que será o
novo ano para nós?
Será o que cada um de nós dele o fizermos. Serão bilhões
de 2018 - um pra cada um! Vai depender da percepção pessoal de construção da
realidade. Vai depender da co-criação nos fenômenos em que se estiver inserido,
engajado, participante dos fatos e acontecimentos sob sua “regência”.
Quem sabe ainda tenhamos tempo de fazer desse pequeno
espaço de tempo, que nos levará a nova convenção de outro Ano Novo, um mundo
melhor para cada um de nós, respeitando o reinado das peculiaridades do outro;
dos sistemas ecologicamente semióticos preexistentes e sobreviventes a nossa
quase insignificante intervenção, na certeza de que, de algum lugar, Forças
Maiores reconheçam Ordem e Harmonia, nos conferindo a confiança de que podemos
fazer desse ano - suscetível a nossa capacidade de percepção, ação e
transformação - o melhor. Façamos de 2018, finalmente, um ano absolutamente
nosso, por conta e risco. Além de tudo, cientifica e filosoficamente, está tudo
certo.
Professora Maria Angela
Coelho Mirault – doutora e mestre em Comunicação e Semiótica e Signo e
Significação das Mídias, pela PUC de São Paulo
03.01.2018
Nenhum comentário:
Postar um comentário